Wednesday, July 25, 2007

bizarre love triangle



"À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos
(...)

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r- eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria dentro e fora de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!
(...)

(Na nora do quintal da minha casa
O burro anda à roda, anda à roda,
E o mistério do mundo é do tamanho disto.
Limpa o suor com o braço, trabalhador descontente
A luz do sol abafa o silêncio das esferas
E havemos todos de morrer,
Ó pinheirais sombrios ao crepúsculo,
Pinheirais onde a minha infância era outra coisa
Do que eu sou hoje)
(...)

Giro dentro das hélices de todos os navios.
Eia! eia-hô! eia!
Eia! sou o calor mecânico e a electricidade!

Eia! e os rails e as casas de máquinas e a Europa!
Eia e hurrah por mim-tudo, máquinas a trabalhar, eia!

Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá!

Hup-lá, huplá, hup-la-hô, hup-lá!
Hé-la! hé-hô! H-o-o-o-o!
Z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z!

Ah não ser eu toda a gente e toda a parte!"

in Ode Triunfal, Fernando Pessoa

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